
Decretado o dia da queda do muro de lamentações.
Abaixo todas as velharias de vivências tristes, descrenças, arrependimentos, mágoas e tudo aquilo que nos enraíza em um mar de sofrimento sem fim.
Abaixo o sentimento de rebeldia adolescente, de raiva do mundo, e de faltas sem sentido.
Abaixo aqueles velhos erros do passado que se entranham em nós em forma de medo paralisante.
Abaixo as lembranças dolorosas, as cartas nunca entregues, as palavras não ditas, a dor pela ausência daquilo que não foi.
Abaixo a fuga do contato profundo e verdadeiro com o outro. A falsa sensação de segurança. A paralisia de viver temeroso e receoso de se fazer conhecer.
Abaixo a sensação de estranhamento no mundo, de auto-conceito impiedoso de quem pensa demais sobre si mesmo sem nunca ter respostas.
O que resta?
O banho na chuva sem se preocupar em como o cabelo vai ficar depois ou no julgamento dos observadores transeuntes.
A gargalhada solta, aberta, completa. Daquelas que ecoam até mesmo no coração de quem não aprendeu a sorrir.
O abraço gostoso, inteiro, de entrega. Daquele que diz tudo mesmo no silêncio.
O cheiro, no cangote, no rosto, nos olhos, no coração de quem corajosamente decidiu-se pelo amor.
O amor, de mãe, de pai, de irmão, de amigo. Daqueles amores que não cabem no peito de tão infinito.
O carinho, exagerado, estremado, enlouquecido de quem não teme ser tachado de maluco. E é loucura a gente decidir viver? E ser? E sentir?
Resta-nos a decisão por lançar-nos nas incertezas do que está aqui, agora.
Viver essa vida confusa, transloucada e não esperar por outra.
Porque a felicidade pode estar aqui do lado. Do meu, do seu, do nosso.
Ao lado de quem acorrentado, chora pelo que já foi e esquece de dar chance ao que virá.
Mantém-se intacto olhando dolorosamente pra trás e não vê o sol iluminando o dia.
Este mesmo sol que nasce todos os dias eternizando os novos ciclos de descobertas de si e do mundo.
E isso é garantia de não sofrimento? Provavelmente não, mas quem disse que viver e ser feliz não pode ser uma doce e fascinante aventura pelas entranhas de um caminho desconhecido?